Quando descemos para tomar um café, que afinal foi cerveja, fomos continuando – não foi bem continuando, foi antes prolongado, porque não havia grande continuidade; o que existiu foi uma sucessão, não uma continuação – a conversa, que era como uma árvore exótica de pensamentos, ideias, interrupções e mudanças de rumo, despontando a partir de um tronco, que seria provavelmente a língua portuguesa e a nossa amizade, em ramos das mais variadas espécies e feitios, vigorosamente e sem regras, sem leis e sem preocupações. É um encanto poder-se conversar divergindo, divagando, perdendo-nos sabe-se lá onde, no meio de pensamentos que não levam a lado algum e cuja beleza e encanto residem precisamente nessa falta de destino, nesse desprendimento pelo objectivo, nesse ingénuo mas convicto desapego pela conclusão.
Nós, eu e ele, quando conversamos não o fazemos para ter razão, provar que temos razão ou aprender qualquer coisa que nos permita, um dia, vir a ter razão. Nada disso. Ter razão é uma coisa absolutamente sobrevalorizada. Prefiro mil vezes ter ideias, mesmo que não me sirvam para nada. Ter razão é uma coisa aborrecida e estática porque culmina imediatamente ali: pois, tens razão. Uma chatice, no fundo. Ter pensamentos desordenados é muito mais divertido e, creio, enriquecedor, porque é uma espécie de mundo de fantasia no qual, magicamente, as coisas não existem porque têm uma função – não, existem porque existem e isso é bom só por si. No fundo é como tudo o resto. Passamos a vida a pensar “existimos porquê?” e parece-me uma questão disparatada e de interesse menor para a qual a resposta é a mais simples de todas: “ora essa, por que não haveríamos de existir?” e sinto-me plenamente satisfeito com esta inversão do raciocínio, bem mais optimista e bem menos quezilenta para com este nosso querido universo que nos pôs a existir.
Falámos, a dada altura, de futebol. E eu gosto muito quando falamos de futebol. É como se falássemos de finanças e eu defendesse a libra e ele o dólar. A libra é a minha preferida, é mais bonita e tal. Na verdade, nenhum de nós percebe patavina de finanças, como, aliás, o extracto de conta de cada um pode facilmente atestar. Com o futebol sucede o mesmo – com o futebol e com quase todos os outros assuntos, já que temos uma extraordinária capacidade para dizer coisas e pensar coisas abdicando, logo à partida, de detalhes insignificantes como “estar correcto”. Mas no futebol as conversas tornam-se particularmente agradáveis, pelo menos para mim, porque me sinto uma criança a dissertar sobre a conquista espacial: é um assunto deveras fascinante acerca do qual nos é permitido fantasiar abundantemente.
Perguntei-lhe então se ele conhecia este meu blogue e ele respondeu «não leio blogues de bola». Nesse momento, houve um misto de sensações: por um lado, tive pena que ele não me lesse; por outro, senti um imenso orgulho na classificação “blogue de bola” que ele atribui a este humilde canto da blogosfera. Penso que foi a primeira vez que tal aconteceu em mais de um ano de existência. É como se, até que enfim, este 227218 fosse “um blogue de bola, oficialmente”. Obrigado Zé.
5 comentários:
"Ter razão é uma coisa aborrecida e estática porque culmina imediatamente ali: pois, tens razão. Uma chatice, no fundo. Ter pensamentos desordenados é muito mais divertido e, creio, enriquecedor, porque é uma espécie de mundo de fantasia no qual, magicamente, as coisas não existem porque têm uma função – não, existem porque existem e isso é bom só por si. No fundo é como tudo o resto. Passamos a vida a pensar “existimos porquê?” e parece-me uma questão disparatada e de interesse menor para a qual a resposta é a mais simples de todas: “ora essa, por que não haveríamos de existir?” e sinto-me plenamente satisfeito com esta inversão do raciocínio, bem mais optimista e bem menos quezilenta para com este nosso querido universo que nos pôs a existir."
Isto é absolutamente BRUTAL! vOU COLOCAR NO MEU MURAL DO FACE SE NÃO TE IMPORTAS!!!!
Como é óbvio, não li. B)
Prefiro pensar, que é um blogue sobre o Benfica.
Um blogue de bola mete muita "palha" à mistura, tipo, Porto, Sporting, Braga, entre outras "coisas" do género.
Abraço
Só agradeço que as citações sejam devidamente creditadas, se possível, com link (se não for possível o link, pelo menos o crédito).
Foi o que fiz... grato pela deferência...
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