Corria o ano de 2010 - e corria muito bem. O Benfica liderava isolado, o Porto estava distante e o Sporting não entrava nas contas. «Ah, então e o Braga?»: o Braga é o Braga. O primeiro nome é Sporting, não nasceu para ganhar. E eu, cabeludo, assumi: quando o Benfica for campeão, rapo o cabelo. O Benfica foi, de facto, campeão. Na noite da consagração, perdi os telefones e os amigos e ainda cheguei a casa tarde, causando visível e lógico transtorno à Lady Verde, para quem o «mas querida, somos campeões!» mereceu um «ai sim? Do quê?», sem esperar por resposta.
Depois de tanta perda, e apesar do nobre ganho, presumi «pá, se a cena era sofrer, o sofrimento está sofrido». E não rapei o cabelo. Seguiu-se a pré-época e um crescimento saudável e contínuo da minha cabeleira campeã nacional, orgulhosa e pujante. Tudo isto sempre sob um olhar castigador da Lady de cada vez que me lembrava «eu devia rapar isto». A reprovação feminina é persuasiva. Em certos casos, traumática. E, assim, eu não cumpri a promessa.
Passou a pré-época e os primeiros sinais apareceram. Não só o cabelo estava mais fraco como, na baliza, na vez do Quim, apareceu um rapaz muito alto e sem jeito. Passámos a sofrer golos ridículos com regularidade e eu pensei «ah, isto é só porque é contra o Nyon, quando for a sério...». Ilusão, como veio a comprovar-se. A época começou e os golos ridículos sucederam-se, faltavam vitórias e a mim atormentava-se-me a consciência. Tomei uma decisão: «vou rapar o cabelo!» e rapei.
Os resultados foram imediatos: o Benfica começou a ganhar e a fazer golos, o Roberto já quase não os sofria muito ridiculamente. Tudo corria bem. É uma pena que a minha decisão tivesse surgido demasiado tarde. Surtiu efeito, mas apenas para me castigar sem piedade. O Benfica ganhou 19 jogos consecutivos, nem isso foi suficiente para chegar ao primeiro lugar; esse foi matematicamente conquistado no nosso Estádio, diante dos meus olhos, da minha impotência, da minha frustração e, sobretudo da minha culpa.
Encontrei, como bom adepto do belo-desporto, o fraco consolo na certeza de que iria, cheio de saudades, ao Jamor, ver o jogo da Taça. Só faltava receber o Porto em casa e ampliar - ou até mesmo apenas aguentar - uma vantagem de dois a zero sacada com méritos no Dragão. Deixei crescer barba e bigode, reuni amigos, reservei garrafãoes de vinho e estabeleci: vou ao Jamor no meu estado mais Benfiquista de sempre. Íamos todos, estava combinado. O bigode era obrigatório até entre a facção feminina.
No entanto, e apesar de termos o vinho e os bigodes prontos, os portistas vieram à Luz fazer-nos a desfeita debaixo das nossas barbas. Coisa ruim. 3 a 1 para eles com uma exibição memorável do Falcao - e o nosso de honra foi por piedade, para o Cardozo marcar de penalty nos descontos. Era um sinal: com pêlos e promessas não se brinca. Um homem é um homem! E o Benfica perdeu o quanto havia para perder. Por culpa minha.
Ver o Benfica na final do Jamor não é o sonho de um Benfiquista: é uma tradição que faz parte do ser Benfiquista. E faz-me falta. Muita falta.
Aqui em baixo, podem ver a minha barba de Benfiquista. Segundo o Senhor Mário Coluna, faz-me falta uma gilete - mas não tanto como me faz falta ver o Benfica no Jamor, digo eu.
Podem clicar para ver mais em detalhe. É uma barba bonita. Já tem meio ano.
E eis o meu compromisso redentor: o Benfica vai ao Jamor e eu estou lá - não com esta barba, mas com o bigode que sobrar dela. E os garrafões de vinho e os amigos, os cachecóis e as bandeiras. Mas, sobretudo, comigo de bigode. Eu quero a festa da Taça. Sim, eu sei que o presidente quer um clube forte a nível mundial. Mas eu não peço tanto. Apenas isto: o Benfica na final do Jamor. A minha barba por esse jogo!
PS: reparem que alterei, inclusivamente, a foto de perfil.
3 comentários:
Belo texto, só possível a um adepto benfiquista! Obrigado!
Parece mesmo o Fidel Castro deste ângulo!
(vê se tiras a verificação de spam, é lixado provar que não somos robôs)
Isso não tem piolhos? :P
lol
Abraço
Enviar um comentário