Mais do que matar saudades de uma final na Europa, o evento de Amesterdão permitiu-me construir uma consciência completamente nova acerca do que é isso de "ir lá", de sentir que "podemos ganhar". Assisti, na minha vida, a quatro finais europeias do Benfica. Da primeira, não me lembro, tinha quatro anos. Das outras duas, lembro-me, mas ainda era um aprendiz de pessoa e de Benfiquista e, como tal, era parco em sentimentos. Recordo-me, por exemplo, de sentir a derrota com o Milan como perfeitamente natural, expectável e lógica. Sem mágoas.
Desta vez, tudo foi diferente. Acompanhei a época do Benfica sempre de perto, vi na Luz todos os jogos que podia ter visto, do campeonato, da Champions - minto: não fui ver com o Barcelona por opção, já que me recusei a participar nessa bizarra excursão de benfituristas -, da Liga Europa, da Taça da Liga e da Taça de Portugal. Não sei ao certo quantos jogos foram, talvez tenham sido uns 25. Fui ver o Benfica - Braga, logo na primeira jornada, empatámos e jogámos muito mal, depois saíram o Javi e o Witsel e eu pensei que seria uma época dramática. E acabou por sê-lo, sem dúvida - mas não era deste tipo de dramatismo que eu falava. Era "dramática" no sentido de "época para esquecer". Mas eu não me vou esquecer desta época, nunca. Não terá na história as letras de ouro que talvez merecesse - decerto, merecia -, mas tem sido uma época de grande descoberta para mim, até ao nível pessoal.
Posso afirmar que, num período profundamente marcado pela perda do meu anterior emprego e por várias outras contrariedades, que acabaram por ter como consequência alguma desorientação - senti-me bastante à deriva, devo confessá-lo -, o Benfica foi a minha maior disciplina, a minha referência, a minha regra e, felizmente, uma generosa fonte de alegrias, uma razão muito especial para estar com certos amigos, um ritual muito forte, uma realidade constante, presente e segura, um excelente motivo para acreditar, para ser optimista, para não me sentir derrotado perante adversidades que, enfrentadas com espírito, estratégia, inteligência e talento, podem ser superadas. O Benfica tem sido uma grande lição, é a minha comunhão e estamos cada vez mais juntos, praticamente inseparáveis.
Na quarta-feira, vinha no metro a ler o Moby Dick tentando abstrair-me um pouco da tensão que a expectativa do jogo começava a gerar em mim, quando tive um pensamento inusitado, surpreendente, inesperado e sem explicação: um bebé, um recém-nascido, na minha cama, entre mim e a Lady Verde. Esse pensamento perturbou-me. Não de um modo negativo, mas agitou-me porque senti coisas com aquela imagem, senti uma estranha forma de ternura, que nunca até então sentira. E, sobretudo, senti que gostava da ideia. O meu pensamento seguinte foi tão absurdo quanto ingénuo e até é um pouco embaraçoso confessá-lo aqui, publicamente - mas foi genuíno e não me envergonha: «se o Benfica ganhar, hoje será um bom dia para fecundar». Eu sei que a Lady Verde, quando - se - ler isto, é capaz de me pôr de castigo durante uns dias, mas isto é a mais pura das verdades e quem diz a verdade não merece castigo.
5 comentários:
Munta bom, como sempre.
Diego, sabes porque tens sempre poucos comentários? Porque não dás hipótese, escreves sempre tudo. E tão bem!
"Recordo-me, por exemplo, de sentir a derrota com o Milan como perfeitamente natural, expectável e lógica. Sem mágoas."
Tu e muitos ;)
Desta vez o Benfica estava a jogar tanto que tive de parar de emborcar jolas porque pensei que tinha de conduzir a caminho do Marquês.
Afinal foi apenas uma doce e momentânea ilusão.
És um artista da escriba!...
Parabéns!
Verdade o que diz o Benfiquista Tripeiro. Gosto muito de ler o que escreves mas raramente comento porque não sei o que dizer.
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