quarta-feira, 28 de março de 2012

E a caravana parte

Há poesia naquele momento desolado. Copos de plástico, latas de cerveja, guardanapos de papel – lixo fresco ao abandono varrido pelo vento. Atrelam-se as roulotes e a noite acaba-se. Restamos nós, conversadores absolutos do Benfiquismo. Nós e as nossas barbas. Vamos embora sem vitórias, descontentes com um pouco de tudo, reconfortados com bocadinhos de nada.

Somos os crentes. Fingimo-nos pensadores e atiramo-nos ao mundo com pesada expressão céptica. Porém, noite após noite, ali estamos nós, cheios de fé, cheios de paixão, mesmo depois de o jogo ter acabado, mesmo depois da derrota magra e amarga. A desconfiança firme dura até faltarem 15 minutos para o jogo começar. Daí em diante, evapora-se, desfaz-se sob o coro encarnado. Daí em diante, tudo é convicção e não há factos que nos desmintam. Somos capazes, tudo é possível, acreditar até ao fim!, vamos a eles!, ainda faltam três minutos!, sobe Artur, sobe, porra! O Artur sobe “agora é que é, pá, agora é que é”. Mas não é. Ainda faltam 12 segundos, calma que ainda vamos lá.

Acaba o jogo e eu sei, eu era capaz de jurar que ainda é possível empatar e, com uma pontinha de sorte, dar a volta a isto. Chegamos às bifanas, trocam-se impressões, há opiniões para toda a gente. Com a imperial a um euro, é apenas uma questão de tempo até haver mais do que uma opinião por assunto por pessoa. Pelos olhares meio escondidos de nós todos perpassa uma ideia: e se voltássemos lá, ahn? Se voltássemos lá? Se calhar ainda era possível. Às vezes acontecem coisas estranhas. Vamos voltar lá. Só falta um golo, um golo, pá, e a gente empata isto, faz lembrar o Arsenal – depois vamos a Inglaterra e viramos a coisa.

Desligam-se as máquinas e a cerveja morre. O M., que lida com coisas sérias todos os dias, diz «o mais difícil é ter de lhes dizer ‘olhe… isto não tem solução, é uma questão de meses’, isso é o que mais me custa». No entanto, as máquinas desligam-se mas a gente ainda acredita. Claro que sim. Vamos para o metro e eu apostava, eu apostava!, que, mesmo depois de as caravanas partirem, mesmo depois de as luzes se desligarem, todos nós ainda acreditávamos que o Tacuara podia esticar o pé e fazer o empate ou que o Jardel repetia a cabeçada, mas desta vez acertava em cheio. Era só tentar. Tentar não custa. O que é que custa tentar?

2 comentários:

Manuel Neves disse...

Foi muito bom. Quero que eles tentem ser Campeões. Mesmo pessimistas, ainda acreditamos. E que eles não cortem os pulsos, à Ricardo (ahahahah)

mago disse...

Conforme ja' disse ao M. e ao Ricardo, exijo repeticao destes momentos em Setembro.