segunda-feira, 5 de março de 2012

“Incha, cabeçudo, incha!”

A frase não é minha – ao nível da criatividade não chego a tanto. É de um amigo portista que teve a amabilidade de ma enviar por SMS. Várias vezes. Portanto, aos potenciais interessados: não percam tempo a repeti-la.

Na sexta-feira à noite e durante o dia de sábado, foram vários os que carinhosamente me solicitaram a atenção e a caridade para pérolas como «então, estás recuperado do enrabanço?». Não, não estou. A única coisa que me consola é poder ter pena de todos vocês. Não posso deixar de sentir uma certa tristeza compassiva para com tanta euforia esbanjada numa coisinha tão encardida, tão suja. No fundo, impressiona-me que alguns portistas vibrem tanto com – perdoem-me o termo – “vitórias à Porto”. Esperava mais de vocês.

Devo dizer que ver um jogo na Casa do Benfica do Porto é, ao nível da expressão e da ideologia, em tudo semelhante a assistir ao desafio no terceiro anel. O índice de putaquepariu é elevadíssimo e o primeiro stock de caralhada de certeza que se esgota ainda antes do quarto-de-hora. Era capaz de jurar que o senhor – não lhe fiquei com o nome, mas poderia perfeitamente chamar-se Armindo – que o senhor Armindo encomendou várias remessas dessa sublime matéria ao longo dos 90 minutos. E digo-o com toda a certeza porque quando, aos 86 minutos, Pedro Proença apontou para o meio do campo, todos os presentes – mulheres e crianças, velhos e novos, sóbrios e nós – tinham ainda muito disso para usar. Mais: quando o amarelo lhe saiu do bolso para admoestar Helton já nos descontos, houve um velhinho ao canto do balcão que lhe sugeriu com nobreza e amizade que metesse – e passo a citar – «o caralho do cartão nessa peida magrinha, ó meu ordinário». Notem como existe aqui um lado cuidadoso, dedicado e atento: «essa peida magrinha». Pedro, cuide de si: peça para trocar as pegas por tickets restaurante.

Isto agora não tem nada a ver com bola, mas o drama do peso e da silhueta foi transversal às várias realidades (e aproximações) em que a semana foi pródiga. Imaginem vocês que um cretino teve mesmo o desplante de gritar ao Manel Cruz, em pleno Sá da Bandeira, «estás magro!» no final do concerto de Supernada – ao invés de um bem mais justo «és grande!». A verdade é que me pareceu, na altura, mais importante demonstrar a minha preocupação em vez da minha admiração. Porventura, fui inspirado pelo velhinho ao canto do balcão, umas horas antes.

A Casa do Benfica do Porto é semelhante ao terceiro anel em termos do vernáculo, mas apresenta claras vantagens ao nível da preparação do mesmo. Isto acontece por dois motivos: 1) porque há minis Sagres com álcool; 2) porque estas são a 60 cêntimos a peça. Se o jogo durasse mais meia-hora, ver-me-ia obrigado a perguntar o resultado a alguém no dia seguinte. Ou a responder às SMS com «mas afinal quanto é que isso ficou, ó meu enormíssimo néscio e iletrado plebeu amoral?».

Se compararmos os dias, recorrendo ao carbono 14 e às recordações de vários amigos, constatamos que sábado foi claramente um dia melhor do que sexta-feira. À tarde, o concerto – obrigado por perguntarem – correu tão bem que nem me lembrei, durante aqueles 50 minutos, que tínhamos arruinado toda a época da melhor equipa do Benfica dos últimos largos anos em hora e meia, havia menos de 24 horas. Ou, se me ocorreu, não foram mais de seis ou sete vezes e isto sempre entre músicas e só quando olhava para os sorrisos sinistros em dezenas de jovens rostos provavelmente portistas. Então pensava «não é que vos odeie, o que sinto é o impulso de vos ofender – mas ainda bem que vieram» e continuava, dizendo para mim «derrotado mas orgulhoso!».

Mais tarde, jantando com músicos e nossas senhoras, constatei a extrema utilidade de conservar uma espécie de rival decrépito. Animar não anima, mas reconforta um pouco e, sobretudo, dissuade a comunicação entre as partes nos dias que se seguem, prevenindo os mais que prováveis desfechos sangrentos. O bónus foi assistir ao jogo em excelente companhia e dizer com toda a confiança «reparem no nome do guarda-redes: aposto que defende o penalty». Meio minuto mais tarde, pedi «um Jameson, faz favor, que isto merece ser sublinhado».

3 comentários:

POC disse...

Bonita experiência a de se ver um jogo nessa grande Casa.

Bons concertos.

rui disse...

nao é so na casa do porto que é assim,eu sou da zona de espinho e ja frequentei varias casas aqui nas redondezas e a do porto nao é sequer a mais mal criada,mas eu gosto disto,gosto desta minha gente somos todos grandes benfiquistas

Diego Armés disse...

Mas eu não diria que é "mal criada". Pelo contrário, é uma casa de cavalheiros com rigor nas palavras. Não mudava uma vírgula ao que ali foi dito.