terça-feira, 6 de março de 2012

Era supersticioso mas já não sou, dava-me azar

Hoje, quem me visse atravessando Alfama, entrando em Santa Apolónia, viajando no metro, trocando no Marquês e saindo em Picoas, diria «este homem não é do Benfica! Este homem vai é ver a bola na Bica!». Não trago nem um sinal de encarnado, uma demonstração, um indício, uma denúncia, uma pista: nada! Tudo em mim é neutro.

Antes do jogo de sexta, ouvi uns rumores que davam conta de macumbas e feitiços e voodoos e pais de santo e santerias e galinhas pretas, olhos de boi, dentes de galo, pés de cavalo-marinho e penas de lagarto, tudo junto e misturado em sangue de cabra velha, deixado a coalhar ao relento em noites de lua cheia, de maneira a prejudicar o Benfica, o Jorge Jesus, o Rodrigo, o Vieira, o Cardozo, o Artur e o Luisão. Pensei para comigo «desperdício de esforço: bastava um Pedro Proença, um Emerson e uma bola e a coisa fazia-se». Quando o Hulk fez o golo logo a abrir perante a passividade daquela alminha, pensei «eu sabia»; quando o Proença acabou o trabalhinho já perto do final, voltei a pensar «eu não disse?».

Houve, porém, um período do jogo que me devolveu à saudável normalidade da superstição e da mezinha: depois de estar a perder, o Benfica deu a volta á situação, fez-se homem, fez-se guerreiro, fez-se vencedor, levou tudo à frente, encostou o adversário, deu um murro na mesa e a seguir virou-a de pernas para o ar. Cardozo marcou de cabeça e, durante uns minutos, fomos campeões não só de Portugal, como de toda a parte, do mundo inteiro! Naquele instante, nada, ninguém, nenhuma equipa era melhor ou mais forte do que nós. Que orgulho. Foi glória... mas demasiado efémera.

Porque então o Aimar caiu, o Witsel caiu, o Garay caiu e eu lembrei-me do Magnólia e das pragas do Egipto. Eles caíam, caíam, caíam, os sapos e o Benfica, ia tudo caindo numa trágica exibição de desamparo e desordem. Percebi que a situação era sobrenatural e não física – muito menos técnico-táctica. Tomei decisões, então, e tomei providências, hoje.

O raciocínio foi simples: se isto é tudo metafísica e quinquilharia de bruxedo, o segredo está na omissão superstição (por mais que isso seja, em si, supersticioso – mas não compliquemos, não vamos agora entrar numa espiral de paradoxos). Os ténis da sorte ficaram em casa, ao lado dos chinelos Cesária Évora. Os boxers são azuis, tal como as meias. As botas calcei-as à estreia em jogos do Benfica. A t-shirt é cinzenta, a camisola é cinzenta, a parka hipster é preta e a écharpe é profundamente gay. Pareço tudo, menos um Benfiquista. Faço qualquer coisa para manter o meu Clube a salvo do mau-olhado.

7 comentários:

Anónimo disse...

Um prognóstico para o jogo: muita luta e garra ,força BENFICAAAAAAAAA

jota_o_golo disse...

Eu hoje tambem decidi o mesmo!! So o cascol no meu carro e q se manteve, pois tenho muito orgulho de mostrar aqui na Alemanha de que Clube eu sou!!! Mas ao contrario dos outros jogos nao vesti a camisola hoje!!! Abraco Glorioso e continua com o bom Trabalho!!!

Unknown disse...

e não é que resultou ?

pitons na boca disse...

T-shirt vermelha, blusa encarnada e corta-vento numa mistura dos dois tons anteriores...
Mas, mais importante que isso tudo, a faixa do Glorioso (adquirida na primeira visita à antiga Luz, vai para mais de vinte anos) bem enrolada à volta do pescoço.
Porque era dia de jogar todos os trunfos.

Éter disse...

Isto significa que vais passar a marcar presença no estádio em dia de Benfica-fcp?

Diego Armés disse...

Significa que, de hoje em diante, não há regras. Que é para as bruxas não me toparem os truques. Nunca se sabe onde verei a goleada da Taça da Liga.

Anónimo disse...

Caro Diego,
Na 3a feira de manha pensei exactamente no mesmo. Gosto sempre de ir a casa, vestir roupa desportiva e uns "tenis da sorte".
Desta vez, irritado com os ultimos resultados, caguei nesses rituais.
Fui pro estadio com o habitual visual de trabalho smart casual e aproveitei o tempo antes do jogo pra ir à tosquia, na calma.
Funcionou! Next!
PN